O PORQUÊ DA
INFÂNCIA
Existem
duas visões extremadas a respeito da infância: uma delas considera a infância
como uma espécie de humilhação, pois o homem se vê num estado de desproteção e
dependência que lhe causa profunda infelicidade (o que em parte é verdade, não
por causa da infância em si, mas por causa do despotismo dos adultos que, ao
invés de proteger a fragilidade infantil, oprimem a criança e abusam dela).
Outros vêem no estado infantil um sonho de beleza e felicidade, uma época de
despreocupação e de fantasia, pela ausência de ocupações sérias.
Em
verdade, a condição infantil não é em si mesma humilhante e, por outro lado,
nem sempre é imune de sofrimento, num estado ideal de felicidade e nem é isenta
de seriedade, pois o período de aprendizagem infantil é de suma importância
para a vida terrena e espiritual. Aquele que acha que ser criança é algo
humilhante talvez seja excessivamente orgulhoso (por isso o ensino de Jesus de
que é preciso se fazer pequenino para entrar no Reino dos Céus). E aquele que
atribui à infância uma época de maravilhosa irresponsabilidade, talvez revele
tendência à fuga da realidade e não se acomode muito com o lado sério da vida,
ou ainda só considere sério o que se relaciona com a luta do ganha-pão, com as
ambições terrenas e, por isso, não vê a seriedade da infância.
É
preciso entender a função do período infantil, para se poder avaliá-lo com
justeza. Afinal, por que Espíritos velhos, vividos, tantas vezes viciados em
erros milenares, já donos de tantas experiências, precisam “entrar de novo no
ventre da mãe” e se fazerem crianças outra vez? A função educativa da
reencarnação – como nova oportunidade de refazer o destino, de aprendizagens
diversas e de resgate de faltas passadas – perderia o sentido se o Espírito não
fosse internado num corpo infantil.
Através
desse processo de esquecimento e renovação da vida, ele pode construir uma nova
personalidade, melhor e mais integral: pode resgatar seus débitos sem se ver
continuamente oprimido pelo sentimento de culpa e vergonha por um passado
tenebroso; pode conviver com inimigos, transformados em parentes e amigos, sem
se dar conta disso, modificando sentimentos e refazendo relações; pode absorver
elementos de novas culturas, aumentando sua bagagem universal.
Mas
a principal finalidade de o Espírito nascer criança outra vez é a de ser
educado novamente. As impressões positivas que recebe durante a infância podem
ser determinantes em sua existência atual e até em próximas vidas. Exatamente
por causa do estado de semi-inconsciência do Espírito encarnado num corpo
infantil, suas barreiras de defesa psíquica estão neutralizadas: ele está mais
receptivo, mais maleável, mais aberto a todas as influências – se lhe forem
dados bons estímulos, sua assimilação poderá ajudá-lo imensamente em sue
progresso espiritual. Assim também uma influência negativa, transmitida pela
Educação, pode complicar muito seu futuro espiritual – mas, nesse caso, a
responsabilidade moral recairá mais sobre aqueles que foram encarregados de sua
Educação e falharam nessa tarefa.
Assim,
é preciso ser criança, a cada nova encarnação, para que, aliviados
momentaneamente das nossas cargas de memória, possamos ser educados e nos
educarmos, e com isso darmos alguns passos adiante no caminho infinito da
evolução.
A
infância é, pois, um estado de humildade – não de humilhação – porque todo
recomeço requer esta virtude. É também um estão de bênção – não por causa da
aparente irresponsabilidade – mas porque o Espírito está na posse do melhor de
si mesmo, de sua capacidade de amar, de se desejo de aprender, de sua
sinceridade natural. Enquanto os vícios passados dormem no subconsciente, a
alma pode dar expansão à sua divindade interior e por isso uma criança,
saudável e natural, é sempre um bálsamo para o adulto, já calejado nas dissimulações
sociais, envolvido na luta aspérrima da sobrevivência na Terra...
O
período infantil é um período muito sério, porque então o homem, ainda não
aparelhado física e psiquicamente para o trabalho considerado produtivo no
mundo, pode se dedicar ao trabalho não-produtivo (economicamente), mas nem por
isso menos importa: o trabalho de aprender, de amar, de construir, a si mesmo,
de observar a vida e as coisas com olhes de interesse e entusiasmo...
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