ANIVERSÁRIO DE ALLAN KARDEC 03 DE OUTUBRO
FAZER O BEM SEM OSTENTAÇÃO
1. Tende
cuidado em não praticar as boas obras diante dos homens, para serem vistas,
pois, do contrário, não recebereis recompensa de vosso Pai que está nos céus.
-Assim, quando derdes esmola, não trombeteeis, como fazem os hipócritas nas
sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Digo-vos, em verdade,
que eles já receberam sua recompensa. - Quando
derdes esmola, não saiba a vossa mão esquerda o que faz a vossa mão direita;
- a fim de que a esmola fique em segredo, e vosso Pai, que vê o que se passa em
segredo, vos recompensará. - (S. MATEUS, cap. VI, vv. 1 a 4.)
2. Tendo
Jesus descido do monte, grande multidão o seguiu. - Ao mesmo tempo, um leproso
veio ao seu encontro e o adorou, dizendo: Senhor, se quiseres, poderás
curar-me. - Jesus, estendendo a mão, o tocou e disse: Quero-o, fica curado; no
mesmo instante desapareceu a lepra. - Disse-lhe então Jesus: abstém-te de falar disto a quem quer que seja;
mas, vai mostrar-te aos sacerdotes e oferece o dom prescrito por Moisés, a fim
de que lhes sirva de prova. (S. MATEUS, cap. VIII, vv. 1 a 4.)
3. Em
fazer o bem sem ostentação há grande mérito; ainda mais meritório é ocultar a
mão que dá; constitui marca incontestável de grande superioridade moral,
porquanto, para encarar as coisas de mais alto do que o faz o vulgo, mister se
torna abstrair da vida presente e identificar-se com a vida futura; numa
palavra, colocar-se acima da Humanidade, para renunciar à satisfação que advém
do testemunho dos homens e esperar a aprovação de Deus. Aquele que prefere ao
de Deus o sufrágio dos homens prova que mais fé deposita nestes do que na
Divindade e que mais valor dá à vida presente do que à futura. Se diz o
contrário, procede como se não cresse no que diz.
Quantos há
que só dão na esperança de que o que recebe irá bradar por toda a parte o
benefício recebido! Quantos os que, de público, dão grandes somas e que,
entretanto, às ocultas, não dariam uma só moeda! Foi por isso que Jesus
declarou: "Os que fazem o bem ostentosamente já receberam sua
recompensa." Com efeito, aquele que procura a sua própria glorificação na
Terra, pelo bem que pratica, já se pagou a si mesmo; Deus nada mais lhe deve;
só lhe resta receber a punição do seu orgulho.
Não saber a mão esquerda o que dá a mão
direita é uma imagem que caracteriza admiravelmente
a beneficência modesta. Mas, se há a modéstia real, também há a falsa modéstia,
o simulacro da modéstia. Há pessoas que ocultam a mão que dá, tendo, porém, o
cuidado de deixar aparecer um pedacinho, olhando em volta para verificar se
alguém não o terá visto ocultá-la. Indigna paródia das máximas do Cristo! Se os
benfeitores orgulhosos são depreciados entre os homens, que não será perante
Deus? Também esses já receberam na Terra sua recompensa. Foram vistos; estão
satisfeitos por terem sido vistos. E tudo o que terão.
E qual
poderá ser a recompensa do que faz pesar os seus benefícios sobre aquele que os
recebe, que lhe impõe, de certo modo, testemunhos de reconhecimento, que lhe
faz sentir a sua posição, exaltando o preço dos sacrifícios a que se vota para
beneficiá-lo? Oh! para esse, nem mesmo a recompensa terrestre existe, porquanto
ele se vê privado da grata satisfação de ouvir bendizer-lhe do nome e é esse o
primeiro castigo do seu orgulho. As lágrimas que seca por vaidade, em vez de
subirem ao Céu, recaíram sobre o coração do aflito e o ulceraram. Do bem que
praticou nenhum proveito lhe resulta, pois que ele o deplora, e todo benefício
deplorado é moeda falsa e sem valor.
A
beneficência praticada sem ostentação tem duplo mérito. Além de ser caridade
material, é caridade moral, visto que resguarda a suscetibilidade do
beneficiado, faz-lhe aceitar o benefício, sem que seu amor-próprio se ressinta
e salvaguardando-lhe a dignidade de homem, porquanto aceitar um serviço é coisa
bem diversa de receber uma esmola. Ora, converter em esmola o serviço, pela
maneira de prestá-lo, é humilhar o que o recebe, e, em humilhar a outrem, há
sempre orgulho e maldade. A verdadeira caridade, ao contrário, é delicada e
engenhosa no dissimular o benefício, no evitar até as simples aparências
capazes de melindrar, dado que todo atrito moral aumenta o sofrimento que se
origina da necessidade. Ela sabe encontrar palavras brandas e afáveis que
colocam o beneficiado à vontade em presença do benfeitor, ao passo que a
caridade orgulhosa o esmaga. A verdadeira generosidade adquire toda a
sublimidade, quando o benfeitor, invertendo os papéis, acha meios de figurar
como beneficiado diante daquele a quem presta serviço. Eis o que significam
estas palavras: "Não saiba a mão esquerda o que dá a direita."
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